domingo, 17 de julho de 2011

O Amor Perfeito no Jardim do Rei

“Você está aqui porque essa existência precisa de você tal como é. Caso contrário, outra pessoa estaria aqui!” 

Ouvi a seguinte história: um rei passeou por seu jardim e encontrou suas árvores, arbustos e flores murchos, quase morrendo. O carvalho disse que estava morrendo porque não podia ser tão alto quanto o pinho. Virando-se para o pinho, percebeu que estava murcho porque não podia dar uvas como a videira. A videira, por sua vez, estava morrendo porque não podia florescer como a roseira. Mas encontrou o amor-perfeito florescente e muito viçoso. Ao perguntar, recebeu a seguinte resposta:
"Acreditei que, ao me plantar, você quisesse um amor-perfeito. Se houvesse desejado um carvalho, uma videira ou uma roseira, teria plantado um deles. Então pensei: já que você havia me colocado aqui, deveria fazer o melhor para ser aquilo que você deseja. Não posso ser nada além daquilo que sou, e estou tentando sê-lo da melhor forma que me é possível".
Você está aqui porque essa existência precisa de você tal como é. Caso contrário, outra pessoa estaria aqui! A existência não teria ajudado você a estar aqui, não o teria criado. Você está cumprindo algo muito essencial, muito fundamental, ao ser como é.
Se Deus quisesse um Buda, ele teria produzido tantos Budas quantos desejasse. Produziu um único Buda - isso bastou, ele ficou satisfeito consigo mesmo, profundamente satisfeito. Desde então ele não produziu outro Buda ou outro Cristo. Em vez disso, criou você. Pare e pense no respeito que o Universo lhe atribui! Você foi escolhido, não Buda, não Cristo, não Krishna.
Você será mais necessário, essa é a razão. Você encaixa melhor agora. O trabalho deles já foi feito, contribuíram com suas fragrâncias para a existência. Agora você deve contribuir com sua própria fragrância.
Contudo, os moralistas, os puritanos, os padres, todos continuam querendo lhe ensinar lições, querem deixar você maluco. Dizem à rosa: "Torne-se um lótus". E dizem ao lótus: "O que você está fazendo aqui? Você deve se tornar alguma outra coisa". Deixam todo o jardim louco e tudo começa a morrer, porque ninguém pode ser outra pessoa, isso não é possível. Foi isso que aconteceu à humanidade. Todos estão fingindo. A autenticidade se perdeu, a verdade se perdeu, todos tentam ser outra pessoa.
Olhe para si mesmo: você está fingindo ser outra pessoa. Mas só pode ser você mesmo, não há outra forma, nunca houve, não é possível ser outra pessoa. Você permanecerá sendo você mesmo. Pode divertir-se com isso e florescer, ou pode secar aos poucos caso condene aquilo que você é.
Você não pode melhorar a si mesmo. Não estou dizendo que não é possível melhor, apenas que você não pode melhorar a si mesmo. Quando você pára de se melhorar, a vida melhora você. Nesse relaxamento, nessa aceitação, a vida começa a fluir por você.
Ninguém jamais foi como você, e ninguém jamais será como você. Você é simplesmente único, incomparável. Aceite isso, ame isso, celebre isso. E dentro desta própria celebração você começará a ver a singularidade dos outros, a incomparável beleza dos outros. O amor só é possível quando há uma aceitação profunda de si mesmo, do outro, do mundo. A aceitação cria um meio em que o amor cresce, é o solo em que o amor floresce.

OSHO!

A Arte de Recomeçar



A nobreza humana não está na coragem com que recebemos o infortúnio, mas na nossa capacidade de prosseguir. 

Os pesadelos acontecem. Uns tempos atrás, um conhecido escritor português contava-me que, chegando ao aeroporto de Caracas, o seu laptop foi roubado sem deixar rastro. Mas o pior não foi o laptop. Nunca é. O pior foi o conteúdo do laptop: um romance original, ou uma parte generosa dele, que só existia no computador. Nenhuma cópia de segurança em casa. Nenhum manuscrito. Nada de nada capaz de compensar a perda absoluta. Meses de trabalho, anos de trabalho, perdidos em segundos.
Ouvi o infortúnio com certo horror e fascínio. E depois recordei a mais bela história intelectual da Inglaterra do século 19, que sinceramente me comove até às lágrimas. Aconteceu com Thomas Carlyle, o notável historiador escocês, tal como ele a relata nas suas memórias. Durante anos de intenso labor e habitando uma pobreza excessiva, Carlyle completara o primeiro volume da sua história da Revolução Francesa. Contara com a ajuda do filósofo John Stuart Mill, que emprestara livros e dinheiro. E quando Stuart Mill, no final da odisséia, pediu de empréstimo o único manuscrito do trabalho para ler, aquele manuscrito que consumira a saúde e a juventude de Carlyle, este o emprestou, grato e honrado.

Foi uma hora funesta. No dia seguinte, Mill regressava, branco como um fantasma, para comunicar que o manuscrito fora acidentalmente consumido pelas chamas.
A descrição que Carlyle nos deixou nas "Reminiscences" ainda hoje emociona qualquer cristão: o estoicismo com que a notícia é recebida, apesar da mortificação interior; as três horas de conversa esforçadamente banal, como se fosse Mill a necessitar de consolo; e quando este deixou finalmente a casa do historiador, para infinito alívio do casal, a mulher de Carlyle, incapaz de fingir normalidade, abraçando um homem destroçado e chorando com o dramatismo que apenas concedemos às óperas clássicas. E as palavras de Carlyle, finalizando a cena, dirigidas a um Deus em que ele, para tragédia sua, não acreditava.
Mas a história não acaba aqui. A história acaba na minha estante, quando folheio, com uma reverência absoluta, a sua História da Revolução Francesa. Porque, depois da notícia das chamas, Carlyle sentou-se à mesa e recomeçou a partir das cinzas. Cada palavra, cada linha. Cada página.
Hoje, quando releio esse monumento de erudição, paixão e estilo, não encontro apenas um dos mais poderosos relatos sobre a glória e a miséria de 1789: as aspirações igualitárias e libertadoras da Bastilha que terminaram, como usualmente terminam, no terror das guilhotinas.
Encontro a evidência de que a nobreza do espírito humano não está na coragem com que recebemos o infortúnio. Mas na forma como o recebemos e, apesar de tudo, somos capazes de continuar. Mesmo quando o mundo nos parece perdido.
Livros de auto-ajuda? Sim, leitores; afinal, eles existem. Nas minhas piores horas, olho para esse volume aparentemente anônimo entre tantos volumes anônimos e há uma gratidão silenciosa e interior que me faz, tantas vezes, recomeçar.